Fernando Pessoa deixou milhares de páginas, na maioria inéditas, com reflexões sobre a sociedade e a política do seu tempo. De singular independência crítica, as suas análises assentam numa vasta cultura, fruto do autodidactismo e da formação britânica. Na fase de maturidade contemplada nesta recolha – entre 1923 e a sua morte, em 1935 – Pessoa assistiu ao advento do autoritarismo político: o triunfo do fascismo em Itália, a instauração de ditaduras militares em Espanha e Portugal, a tomada do poder pelos nazis na Alemanha e a formação do Estado Novo de Salazar. O seu pensamento político seguiu um trajecto por vezes sinuoso e hesitante, que o levaria da crítica demolidora da República democrática a uma defesa condicional da Ditadura Militar e, por fim, à rejeição do salazarismo, expressa inequivocamente no ano final da sua vida. Aliás, Pessoa foi pioneiro na condenação simultânea do comunismo e dos fascismos. Nacionalista místico, individualista radical e conservador liberal de “estilo inglês”, sempre céptico da democracia e do
Estado, acabou silenciado pelo regime de Salazar quando interveio publicamente em nome da liberdade do espírito e da dignidade humana.
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Fernando Pessoa
Um dos maiores génios poéticos de toda a nossa Literatura e um dos poucos escritores portugueses mundialmente conhecidos. A sua poesia acabou por ser decisiva na evolução de toda a produção poética portuguesa do século XX. Se nele é ainda notória a herança simbolista, Pessoa foi mais longe, não só quanto à criação (e invenção) de novas tentativas artísticas e literárias, mas também no que respeita ao esforço de teorização e de crítica literária. É um poeta universal, na medida em que nos foi dando, mesmo com contradições, uma visão simultaneamente múltipla e unitária da Vida. É precisamente nesta tentativa de olhar o mundo duma forma múltipla (com um forte substrato de filosofia racionalista e mesmo de influência oriental) que reside uma explicação plausível para ter criado os célebres heterónimos - Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, sem contarmos ainda com o semi-heterónimo Bernardo Soares.
Fernando Pessoa nasceu em Lisboa em 1888 (onde virá a falecer) e aos 7 anos partiu para a África do Sul com a sua mãe e o padrasto, que foi cônsul em Durban. Aqui fez os estudos secundários, obtendo resultados brilhantes. Em fins de 1903 faz o exame de admissão à Universidade do Cabo. Com esta idade (15 anos) é já surpreendente a variedade das suas leituras literárias e filosóficas. Em 1905 regressa definitivamente a Portugal; no ano seguinte matricula-se, em Lisboa, no Curso Superior de Letras, mas abandona-o em 1907. Decide depois trabalhar como "correspondente estrangeiro". Em 1912 estreia-se na revista A Águia com artigos de natureza ensaística. 1914 é o ano da criação dos três conhecidos heterónimos e em 1915 lança, com Mário de Sá-Carneiro, José de Almada-Negreiros e outros, a revista "Orpheu", que dá origem ao Modernismo. Entre a fundação de algumas revistas, a colaboração poética noutras, a publicação de alguns opúsculos e o discreto convívio com amigos, divide-se a vida pública e literária deste poeta.
Pessoa marcou profundamente o movimento modernista português, quer pela produção teórica em torno do sensacionismo, quer pelo arrojo vanguardista de algumas das suas poesias, quer ainda pela animação que imprimiu à revista "Orpheu" (1915). No entanto, quase toda a sua vida decorreu no anonimato. Quando morreu, em 1935, publicara apenas um livro em português, "Mensagem" (no qual exprime poeticamente a sua visão mítica e nacionalista de Portugal), e deixou a sua famosa arca recheada de milhares de textos inéditos.
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