O Livro do Desassossego, inacabada e fragmentária obra em prosa de Fernando Pessoa, tornou-se ironicamente na mais célebre monografia de um dos maiores, mais traduzidos, publicados e lidos poetas do séc. XX. O Livro apresenta-se como uma epopeia do Negativo, através da lupa de um anti-herói, o semi-heterónimo Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros em Lisboa, que nas horas vagas deambula pela urbe e redige reflexões aparentemente desconexas, unidas, porém, pelas vivências na cidade decadente e por duas ideias-chave que as atravessam: a dissolução do universo burguês e a sublimação da irrealidade existencial através da realidade da escrita. A presente antologia essencial do Livro do Desassossego reúne um prefácio escrito pelo próprio Pessoa e 49 fragmentos representativos da obra, congregados em sete temas — «A Vida Moderna», «O Devaneio», «A Cidade», «A Sensação», «A Identidade», «A Obra» e «A Filosofia da Composição» —, pensados no seu conjunto como um mapa para navegar pelo universo poético do autor. Os fragmentos selecionados proporcionam um encontro íntimo com os seus trechos essenciais e permitem ao leitor descobrir por que razão esta obra póstuma se tornou um dos mais importantes legados literários de Fernando Pessoa e um tesouro da literatura mundial contemporânea. Com seleção e introdução de Diego Giménez, um dos mais reputados especialistas no Livro do Desassossego, a antologia é enriquecida com o prefácio de João Costa e o contributo de Marta Nunes, uma das mais talentosas ilustradoras portuguesas da nova geração, cujas criações originais acrescentam uma camada de releitura visual em harmonia com a sensibilidade atemporal da escrita de Pessoa.
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Fernando Pessoa
Um dos maiores génios poéticos de toda a nossa Literatura e um dos poucos escritores portugueses mundialmente conhecidos. A sua poesia acabou por ser decisiva na evolução de toda a produção poética portuguesa do século XX. Se nele é ainda notória a herança simbolista, Pessoa foi mais longe, não só quanto à criação (e invenção) de novas tentativas artísticas e literárias, mas também no que respeita ao esforço de teorização e de crítica literária. É um poeta universal, na medida em que nos foi dando, mesmo com contradições, uma visão simultaneamente múltipla e unitária da Vida. É precisamente nesta tentativa de olhar o mundo duma forma múltipla (com um forte substrato de filosofia racionalista e mesmo de influência oriental) que reside uma explicação plausível para ter criado os célebres heterónimos - Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, sem contarmos ainda com o semi-heterónimo Bernardo Soares.
Fernando Pessoa nasceu em Lisboa em 1888 (onde virá a falecer) e aos 7 anos partiu para a África do Sul com a sua mãe e o padrasto, que foi cônsul em Durban. Aqui fez os estudos secundários, obtendo resultados brilhantes. Em fins de 1903 faz o exame de admissão à Universidade do Cabo. Com esta idade (15 anos) é já surpreendente a variedade das suas leituras literárias e filosóficas. Em 1905 regressa definitivamente a Portugal; no ano seguinte matricula-se, em Lisboa, no Curso Superior de Letras, mas abandona-o em 1907. Decide depois trabalhar como "correspondente estrangeiro". Em 1912 estreia-se na revista A Águia com artigos de natureza ensaística. 1914 é o ano da criação dos três conhecidos heterónimos e em 1915 lança, com Mário de Sá-Carneiro, José de Almada-Negreiros e outros, a revista "Orpheu", que dá origem ao Modernismo. Entre a fundação de algumas revistas, a colaboração poética noutras, a publicação de alguns opúsculos e o discreto convívio com amigos, divide-se a vida pública e literária deste poeta.
Pessoa marcou profundamente o movimento modernista português, quer pela produção teórica em torno do sensacionismo, quer pelo arrojo vanguardista de algumas das suas poesias, quer ainda pela animação que imprimiu à revista "Orpheu" (1915). No entanto, quase toda a sua vida decorreu no anonimato. Quando morreu, em 1935, publicara apenas um livro em português, "Mensagem" (no qual exprime poeticamente a sua visão mítica e nacionalista de Portugal), e deixou a sua famosa arca recheada de milhares de textos inéditos.
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