Sinopse
Obra inspiradora do Surrealismo, tudo nestes Cantos foge ao convencional — desde logo pela temática em torno do mal, concentrada em Maldoror, personagem transgressiva, violenta, de uma perversidade extrema, até à forma dos versos, que são na verdade longos parágrafos torrenciais, a que acresce um narrador que é por vezes o personagem principal e noutras um mero observador que se conserva a distância segura —, numa história de ritmo frenético, rodeada de escuridão e estranheza, mas numa escrita de enorme vivacidade e especialmente crítica do homem.
A Maldoror chega às cinquenta publicações recuperando a tradução de Pedro Tamen, e acrescentando a estes Cantos de Maldoror os desenhos que René Magritte compôs para esta obra.
Ler mais
Autor(es)
Isidore Ducasse, Conde de Lautréamont
Isidore Lucien Ducasse nasceu em Montevideu, no Uruguai, a 4 de Abril de 1846.
O pai, François Ducasse, era chanceler do consulado francês, e a mãe, Jacquette-Celestine Davezac, morreu poucos meses depois do nascimento do filho.
Em 1859, François Ducasse enviou o filho para França, onde Isidore estudou em regime de internato, primeiro no Liceu Imperial de Tarbes, e mais tarde no Liceu Louis-Barthou, em Pau. Em 1867, com 21 anos, e após uma curta estadia em Montevideu, Isidore Ducasse rumou a Paris, decidido a tornar-se escritor, ofício para o qual foi contando com a mesada que o pai lhe destinava a cada mês.
Em 1868, publicou, de forma anónima e a expensas próprias, uma pequena brochura. Era o primeiro canto dos Cantos de Maldoror. No ano seguinte, esse primeiro canto figurou numa antologia onde Ducasse usou pela primeira vez o pseudónimo que perduraria para os dias de hoje — Conde de Lautréamont.
A publicação da totalidade dos seis Cantos de Maldoror aconteceria ainda no ano de 1869, pela mão do belga Albert Lacroix, editor de Zola. Porém, uma vez com o livro em mãos, o editor arrepiou caminho e recusou-se a distribui-lo, receando acusações de blasfémia e obscenidade. Não era receio menor, já que tudo nestes Cantos foge ao convencional — desde logo pela temática em torno do mal, concentrada em Maldoror, personagem transgressiva, violenta, de uma perversidade extrema, até à forma dos versos, que são na verdade longos parágrafos torrenciais, a que acresce um narrador que é por vezes o personagem principal e noutras um mero observador que se conserva a distância segura —, numa história de ritmo frenético, rodeada de escuridão e estranheza, mas numa escrita de enorme vivacidade e especialmente crítica do homem.
Enquanto Ducasse se desdobrava em contactos para ver o livro distribuído, apelando a críticos, outros editores e escritores de renome, dedicou-se a outra obra onde pretenderia fazer o contraponto com os Cantos de Maldoror para desta feita cantar o bom e o belo, numa espécie de triunfo da lucidez sobre o universo negro e confuso de Maldoror, formando ambas as obras uma dicotomia sobre o bem e o mal. Esta segunda obra — Poesias. Prefácio a um livro futuro — ficaria por terminar, embora este primeiro esboço tenha sido publicado, em 1870.
Isidore Ducasse, Conde de Lautréamont, figura misteriosa de que pouco se conhece, morreu a 24 de Novembro de 1870, num quarto de hotel, em Paris, de causas desconhecidas.
Em 1879, a primeira edição dos Cantos de Maldoror foi finalmente comercializada. A repercussão da obra revelou-se modesta, embora relevante o suficiente para ser reimpressa em 1890. Seriam precisos mais uns anos para, no rescaldo da Primeira Guerra Mundial, uma cópia do livro ir parar às mãos de Phillipe Soupault, que por sua vez o mostrou a André Breton. Estava aberto o caminho para o Surrealismo.
Ler mais René Magritte
René François Ghislain Magritte nasceu em Lessines, na Bélgica, a 21 de Novembro de 1898. Foi o mais velho dos três filhos de Léopold Magritte, alfaiate e comerciante de têxteis, e de Regina Bertinchamps. A mãe viria a suicidar-se em 1912, afogando-se no rio Sambre; Magritte contava catorze anos de idade.
Foi em 1910 que René Magritte começou a ter aulas de desenho, no ateliê de Félicien Defoin, e as suas primeiras pinturas a óleo eram de estilo impressionista.
Amante de cinema, interessou-se também pela imagem dos cartazes e por fotografia, curiosidade aguçada por uma câmara de filmar Pathé, oferecida pelo pai.
Em 1916, René Magritte ingressou na Académie Royale des Beaux-Arts de Bruxelas, onde foi colega de Paul Delvaux, mas encontrou uma formação pouco inspiradora e a sua frequência foi irregular. No início da década seguinte, as suas pinturas começaram a sofrer influência do futurismo e do cubismo de Metzinger.
Magritte cumpriu o serviço militar, em 1920, servindo na infantaria belga, e dois anos mais tarde casou com Georgette Berger, que conhecera na infância, mas que perdera de vista. Por essa altura, trabalhou como designer de cartazes e anúncios numa fábrica de papel de parede, ocupação de que abdicou quando, em 1926, assinou contrato com a Galerie le Centaure, em Bruxelas.
Foi por intermédio de Marcel Lecomte e de Camille Goemans que Magritte travou conhecimento com o dadaísmo e descobriu a pintura Chant d’amour, de Giorgio de Chirico, que sempre descreveu como uma revelação. Em 1926, produziu a sua primeira pintura a óleo surreal, O Jóquei Perdido (Le jockey perdu), e, em 1927, estreou-se com uma exposição em Bruxelas. A recepção crítica não foi, porém, a desejada e Magritte resolveu instalar-se em Paris, onde se tornou amigo de André Breton, Paul Éluar, Salvador Dali, e se envolveu com o grupo surrealista.
A estada na capital francesa foi curta; a Galerie le Centaure encerrou no final de 1929, ano de crise financeira, e, no ano seguinte, Magritte regressou a Bruxelas e retomou o trabalho com publicidade, na agência que dividia com o irmão, Paul.
Os anos trinta foram férteis em exposições e viagens: Bruxelas, Nova Iorque, Londres; mas o fim da década traz a ocupação alemã à Bélgica e uma nova fase de experimentação para Magritte: explorou as técnicas impressionistas no seu «Período Renoir» e levou o surrealismo ao expoente no «Período Vaca», produzindo cerca de quarenta pinturas e guaches em tons berrantes, num exercício que pretendia desafiar os limites do bom gosto.
Foi em 1945 que René Magritte realizou setenta e sete desenhos para ilustrar Os Cantos de Maldoror, obra de Lautréamont, figura misteriosa por cuja obra os surrealistas sempre sentiram uma profunda admiração.
São os anos cinquenta que trazem, finalmente, o reconhecimento mundial a Magritte, artista enigmático, obcecado pela repetição, e que melhor define a sua pintura como sendo composta «por imagens visíveis que não escondem nada; evocam mistério e, de facto, quando se vê uma das minhas pinturas, faz-se a seguinte pergunta simples: “O que é que isto significa?” Não significa nada, porque o mistério não significa nada, é incognoscível.»
Magritte morreu de cancro do pâncreas, a 15 de Agosto de 1967, em Bruxelas.
Ler mais