«Encontramos, sem dúvida, em A Tempestade algumas características do género literário utópico. A chegada à ilha dos novos habitantes é precedida por um naufrágio — artifício narrativo recorrente na literatura utópica — que evoca, a nível simbólico, o afundamento dos valores da sociedade real; a tempestade permite a ablução dos viajantes de uma vida regida por imagens falsas, sendo o processo de purificação completado pela acção do fogo que atinge a embarcação; e a ilha, a que é habitualmente associada a figura geométrica mais perfeita — o círculo, que não tem quaisquer arestas —, apresenta-se como um local de encontro com o Outro, privilegiado porque desconhecido e isolado do resto do mundo. Importará, contudo, analisar criticamente estas circunstâncias que aproximam A Tempestade da literatura utópica, e ter em conta pelo menos três aspectos essenciais. O primeiro prende-se com a comunidade (de três habitantes: Próspero, Miranda e Calibã) que vive na ilha e que se rege por valores iguais aos da sociedade real. Com efeito, mais do que a descoberta de formasalternativas — exequíveis ou não — de organização social — e que, como lembra Krishan Kumar, de nem o “modo utópico” —, o que ressalta da peça shakespeariana é a vontade de exploração de percursos humanos de arrependimento e de regeneração moral.»
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William Shakespeare
William Shakespeare, dramaturgo, poeta e ator inglês, nasceu, crê-se, a 23 de Abril de 1564 em Stratford-upon-Avon, numa família de comerciantes bem-sucedidos. Apesar de poucos registos terem chegado até nós sobre esta época, terão constado da sua educação a aprendizagem do Latim e a leitura extensiva dos autores clássicos. Aos 18 anos, casou com Anne Hathaway, com quem teve três filhos: Susanna e os gémeos Hamnet e Judith.
Em 1594, junta-se à companhia de teatro The Lord Chamberlain’s Men, mais tarde renomeada como The King’s Men, em Londres, com que trabalharia até ao fim da sua carreira. Entre 1585 e 1613, a produção dramática de Shakespeare é inigualável: Ricardo III e Henrique IV são as suas primeiras produções teatrais, seguidas de Tito Andrónico, Comédia de enganos e Dois senhores de Verona. Mais tarde, seguir-se-ão Sonho de uma noite de verão, O mercador de Veneza, Como quiserem, Muito barulho por nada. Com Romeu e Julieta e Júlio César, Shakespeare abre o caminho para a escrita daquelas que viriam a ser as suas obras-primas, maioritariamente escritas nos primeiros anos do século XVII: Hamlet, Otelo, O rei Lear, MacBeth, António e Cleópatra, Corialano. No final da sua carreira, conclui Cimbelino, O conto de inverno e A Tempestade.
Apesar de a maioria das suas peças ter sido publicada com considerável êxito enquanto viveu, só mais tarde se compreendeu a verdadeira dimensão do seu génio e o caráter inovador do seu trabalho. A extensão da sua influência ultrapassa as fronteiras do tempo, do espaço e da língua inglesa, verificando-se em escritores de todo o mundo, do século XVII aos dias de hoje, além de romper com os próprios limites linguísticos, sendo observável em manifestações artísticas de todo o tipo, como na música, na pintura e na sétima arte, bem como nas fundações da psicanálise, pela mão de Sigmund Freud.
Considerado um dos poetas mais importantes da língua inglesa e um dos dramaturgos mais influentes de sempre, o legado do «bardo de Avon», que se estende por 39 peças de teatro (comédias e tragédias) 154 sonetos e 3 poemas épicos, desperta, até hoje, a admiração e o entusiasmo de quem estuda e interpreta a sua obra.
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