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As Minas de Jales - De Ouro e de Gente Valente que Lutou pelos seus Filhos

João Machado

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Sinopse

A mina jazia escondida nas profundezas do subterrâneo, com mais de vinte quilómetros em galerias, ligada ao exterior pelos dois poços principais; o Poço de Santa Bárbara por onde arreavam os homens, os machos e os materiais e o Poço 1, no extremo norte, por onde se efetuava a extração de todo o minério.

Nos anos sessenta ninguém nas Minas sabia de luta de classes, mas a geografia dos bairros era rigorosamente hierarquizada por degraus de acordo com a condição socioeconómica. O almoço na festa de Santa Bárbara em casa dos patrões para a aristocracia de Lisboa era copioso. O sentimento de injustiça absorvido pelas crianças é irremediável.

Na escuridão da mina não existia medo; os marteleiros faziam uma “pega“ completa de furos com um metro e meio de comprido, seguia-se no turno da tarde o carregamento do fogo com os explosivos a serem colocados na boca dos furos com a mão (...).

As mulheres dos trabalhadores residentes tinham regra geral uma catrefada de filhos, que vestiam e alimentavam, ao mesmo tempo que faziam a lide doméstica, lavavam a roupa no Tanque, ajudavam nas hortas e tratavam dos recos.

Nos dias de ventania levantava-se do Branquinho, daquela imensa escombreira de estéril, uma poeira espessa e intensa num redemoinho incessante que fustigava os bairros, atingindo os olhos e as narinas dos residentes. Infelizmente o Branquinho galgou terrenos e contaminou águas e lameiros, até as trutas-de-rio do Tinhela deixaram de prestar abaixo da ponte do Borralheiro.

Os nossos pais transmitiam insatisfação e revolta. Eram gente valente e assombrada, tolhidos talvez por um certo temor reverente e pelo receio das suas famílias. O mundo vivia uma década de convulsões e mudanças e no país a emigração e a guerra colonial perpassavam entre nós. A ditadura e a igreja estavam entranhadas. Não podíamos continuar cegos e nus. Em 1974 o medo retardou a liberdade.

***

É difícil imaginar maior dureza de trabalho do que a destes homens simples, encafuados num buraco lôbrego e alumiados por uma ténue luz que provinha do gás acetileno produzido da mistura de carburetos com água no gasómetro.

Desde a infância, o meu olhar fixou-se enternecido na singularidade daqueles mineiros destemidos que quando despegavam do trabalho da mina, passavam diante de nós molhados e sujos de lama, com os rostos fuliginosos, de capacete na cabeça e o gasómetro dependurado no ombro pelo gancho.

As minas encerraram maldosamente em outubro de 1992 com muitas toneladas de ouro no seu interior.

Das Minas, sabe-se o que resta hoje; morde-se a língua com a pobreza e o desemprego ou quando se ouve chamar de forma tremendamente hiperbólica Faixa de Gaza ao Bairro da Saíça.

Cinquenta anos depois do 25 de abril de 1974, começa a perder-se, talvez, o gume desse passado, mas esse tempo não foi indiferente: o vigilante Sr. Vitorino e a sua esposa Sra. Alice, que moraram no Bairro da Saíça, onde tiveram muitos filhos, registaram e batizaram o filho que nasceu a 25 de Abril de 1975 com o nome Manuel da Liberdade.

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Autor

João Machado

JOÃO Manuel da Costa MACHADO, nasceu nas Minas de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar a 3 de Julho de 1955, numa fratria de oito irmãos. Concluíu a licenciatura em Medicina em 1981.

Foi chefe de Serviço de Medicina Interna e assistente graduado de Doenças Infecciosas no Hospital de Curry Cabral (Lisboa), onde trabalhou de 1982-2017; foi também Diretor do Serviço de Urgência (2003-2006), Diretor Clínico (2010- -11) e consultor na transplantação hepática (2012-2017).

De 2017-2021 trabalhou no Hospital Prof. Doutor Fernando da Fonseca (Amadora) onde foi Diretor de Serviço de Medicina Interna e do Serviço de Urgência.

Publicou em 2021 o livro Tributo aos doentes com VIH/SIDA do Hospital de Curry Cabral.

Tem 3 filhos.

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